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terça-feira, 15 de abril de 2014

Resenha nº 37 - Corações descontrolados, de Ana Beatriz Barbosa Silva

  • Este é um livro que pode ser enquadrado no campo da divulgação científica. Ana Beatriz Barbosa Silva, sua autora, é uma experiente médica graduada pela UFRJ, com pós-graduação em psiquiatria. Tornou-se referência nacional no tratamento de transtornos  mentais. É autora das obras Mentes Perigosas – O psicopata mora ao lado, Bullying – Mentes perigosas nas escolas, Mentes Inquietas – TDAH: desatenção, hiperatividade e impulsividade, Mentes e Manias – TOC: Transtorno Obssessivo-Compulsivo, Mentes Ansiosas – Medo e ansidedade além dos limites e Mundo Singular – Entenda o autismo (esse último em parceria com Mayara Bonifácio Gaiato e Leandro Thadeu Reveles).

Trata-se de um texto fácil de ler, apesar de abordar assunto tão complexo como o Transtorno de Personalidade Borderline – TPB. Os portadores desse tipo de transtorno têm sentimentos e emoções exarcebados sempre, numa espécie de ansiedade, angústia vital. Instabilidade de emoções talvez seja a expressão que melhor dê ideia a nós, público leigo, sobre a característica border.

Várias disfunções, didaticamente divididas em quatro aspectos – emocional, cognitivo, comportamental e pessoal – estão presentes nesta obra sobre o  transtorno abordado. Os borders sofrem de uma abismal baixa autoestima e têm problemas, principalmente, quando sofrem rejeição de algum tipo. Metem-se constantemente em relações amorosas “que todo mundo vê que não vai dar certo”. Tais rejeições são para eles um motivo de explosão incontrolável, após o que lhes advém o ódio, a ira e a vergonha em relação a si mesmos.

No filme Mulheres à beira de um ataque de nervos, de Pedro Almodóvar, a protagonista Peppa (Carmem Maura) é exagerada em suas emoções, impulsiva. Depois que seu amante Ivan encerra o relacionamento com ela, a instável e explosiva Peppa joga a mala de Ivan no lixo, põe fogo na cama do casal, numa reação típica dos portadores de Transtorno de Personalidade Borderline.

O TPB acomete, segundo Ana Beatriz, mais as mulheres do que os homens, justamente por ser a mulher mais envolvida com sentimentos; há, entretanto, muito mais homens psicopatas do que mulheres, pela maior propensão do masculino para a razão, a frieza.

O transtorno de que estamos falando é extremamente difícil de ser diagnosticado, tanto assim que pacientes só são diagnosticados corretamente após dez anos de perambulação por consultórios de psicólogos e de psiquiatras. Somente um terapeuta experimentado pode ajudar o border de uma maneira efetiva. Não existem remédios específicos para o mal, mas alguns psicotrópicos, normalmente receitados para outros tipos de transtornos podem ajudar. Todavia, a terapia é baseada na recuperação da autoestima.

O TPB, quando acontece, acaba por expor sua característica mais evidente, o descontrole emocional, a partir da adolescência, pois é nessa fase que os hormônios são abundantes e algo descontrolados, além de ser também o momento da vida em que o ser humano se inicia nas relações amorosas, ainda cheio de medos e incertezas – com possibilidades maiores de rejeição.

Ana Beatriz elenca várias personalidades, possivelmente portadoras de Transtorno de Personalidade Borderline, apesar de deixar claro serem apenas indicações, baseadas na sua experiência e na observação. Assim, temos Amy Winehouse – explosiva, encrenqueira e talentosa; Marilyn Monroe – bela, sexy e imortal; Tony Curtiss, Janis Joplin, Elizabeth Taylor, etc. Indiscutíveis talentos, famosos, personalidades difíceis e instáveis.

Conhecer um pouco do Ser Humano, capaz de loucuras abomináveis e realizações admiráveis é altamente instigante. Todos nós, assegura Ana Beatriz e eu acredito mesmo nisso, somos portadores de algum traço de transtorno. Quando nos apaixonamos, por exemplo, apresentamos um indício de transtorno borderline: vivemos um excesso de sensações, de sentimentos. O fim de um relacionamento pode atirar uma pessoa ao fundo de uma depressão. O problema do border típico é que esse estado não é episódico, e, junto a outras características, faz dele uma bomba pronta a explodir ao menor atrito.

Um livro muito elucidador, muito bom. Vários leitores poderão achar a leitura um tanto difícil de ser vencida, pois não se trata de uma narrativa (embora o livro tenha muitas delas). A autora teve o cuidado de providenciar a “tradução” de termos técnicos e procurou adaptar-se ao seu público-alvo. Para professores, penso que deveria ser leitura se não obrigatória, pelo menos fortemente recomendada.

BARBOSA Silva, Ana Beatriz. Corações descontrolados. Editora Fontanar. Rio de Janeiro, RJ: 2010

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