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sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Resenha Nº 113: A Verdade Sobre O Caso Harry Quebert, de Jöel Dicker

Título original: La verité sur l’affaire Harry Quebert
Título em português : A verdade sobre o caso Harry Quebert
Tradutor: André Telles
Edição: n/c
Copyright: 2012
ISBN: 978-85-8057-511-8
Gênero literário: Romance
Editora: Intrínseca
Quantidade de páginas: 576
Literatura suíça
Bibliografia do autor: Les derniers jours de nos Pères (Os Últimos Dias de Nossos Pais), 2012; La verité sur l’affaire Harry Quebert (A verdade sobre o caso Harry Quebert), 2012; Le livre des Balltimore (O livro dos Baltimore), 2015.

Jöel Dicker nasceu em 1985, em Genebra, Suíça. Aos 19 anos, segundo consta, frequentou o curso Florent, em Paris. Regressou à Suíça após um ano, para estudar na Faculdade de Direito de Genebra, onde tirou o mestrado, em 2010. Com a idade de 25 anos, Jöel ganhou o Prix des Écrivains Genevois (Prêmio dos Escritores genoveses),  atribuído a manuscritos não publicados, pelo original Les Derniers Jours de Nos Pères. Bernard de Fallois, um editor francês, adquiriu o direito desta obra e de La verité sur l’affaire Harry Quebert. Durante a feira do livro de Frankfurt, La verité... foi negociado por editores estrangeiros e o livro foi publicado em mais de 32 línguas. Posteriormente, ele ganhou o prêmio Goncourt, na França.

Em uma das livrarias de Belo Horizonte, dei de cara com este exemplar de A verdade sobre o caso Harry Quebert, numa gôndola de saldões, por R$ 19,00. Como sempre faço, folheei o volume, um tijolaço de 576 páginas; li o que estava escrito na quarta capa, mas o que mais me intrigou foram duas páginas iniciais cobertas de elogios fervorosos de vários jornais. Segundo o que lia ali, “A verdade sobre o caso Harry Quebert, do suíço Jöel Dicker, de apenas 28 anos, é o livro mais inteligente e intrigante que você vai ler este ano. O romance francês mais comentado da década, com uma trama de tirar o fôlego e uma história viciante.” Assinando, The Telegraph. “Mas, espera aí, pensei eu, como assim, ‘romance francês’? Não é suíço?
Bom, de qualquer jeito, tenho um livro aparentemente extraordinário em mãos. Resolvi comprá-lo, uma vez que viajaria de férias logo depois e esta poderia ser uma boa leitura.

Terminei de ler A verdade sobre o caso Harry Quebert em quatro dias, enquanto meus parentes e amigos iam para a praia e eu ficava em casa. As impressões sobre o que lia se alternaram muito durante a leitura do volume.
Jöel Dicker conseguiu, sem dúvida, uma proeza. São 576 páginas de um enredo complexo, cheio de reviravoltas como em filmes de ação; muitos personagens vão aparecendo, cada qual com seus segredos (às vezes, muito forçados, a bem da verdade)  a serem desvendados pelo detetive ocasional Marcus Goldman.
Enredo: Marcus Goldman é um escritor famoso por um livro recém-publicado. Ganha muito dinheiro, seu trabalho torna-se um best-seller e ele mergulha de cabeça nas delícias desta vida faustosa. Anda com atrizes hollywoodianas, dá festas estrondosas. Entretanto, seu editor e seu agente literário o alertam: é melhor começar a escrever a próxima obra, se quiser se manter no topo. Passado algum tempo, o público começa a esquecê-lo. Marcus tem de produzir outro livro. Sobre o quê? Ele enfrenta o terror dos escritores, o bloqueio criativo. Nenhuma ideia lhe ocorre. Nada. Decide, então, visitar seu mentor literário, o tal Harry Quebert do título, na cidadezinha de Aurora, em New Hampshire. A notícia de que o corpo da jovem Nora Kellergan, morta aos quinze anos em 1975, fora encontrado no jardim da casa de Quebert explode na mídia. Quebert confessa ter tido um caso com ela, trinta e três anos antes, mas declara-se inocente quanto ao assassinato dela. É aí que Marcus Goldman, travestido em detetive, resolve investigar o caso por sua própria conta, escarafunchando a vida de uma porção de pessoas de Aurora.
Quem teria matado Nora Kellergan? Em que condições? Qual seria o móvel do crime? Para responder tais questões, o narrador – Marcus Goldman – leva o leitor por intensas reviravoltas. Pistas falsas, deduções reformuladas, novos descobrimentos; a lista de suspeitos é imensa.
O romance se utiliza de depoimentos escritos, relatórios policiais, trechos do livro As origens do mal, a obra-prima que Harry havia escrito para Nola e cujo original fora encontrado dentro de uma bolsa, junto ao corpo enterrado da jovem; citação de outro livro, As gaivotas de Aurora, de um tal Luther Caleb; correspondências amorosas de Quebert para Nola. Tais recursos conferem ar de modernidade ao livro.
Em termos de estrutura, os capítulos são numerados em ordem decrescente, do trinta e um para o primeiro. Abrindo cada capítulo, conselhos do experiente Harry Quebert a Marcus Goldman; ainda, um retângulo vertical simboliza uma página incialmente branca e que vai sendo preenchida à medida em que os capítulos avançam.
O enredo é do tipo não linear, isto é, passado e presente se alternam, e o autor marca bem estes lapsos temporais de modo a facilitar a leitura para o leitor mediano.
A leitura é realmente viciante. O leitor nem respira diante de tantas reviravoltas. Entretanto, algumas coisas, a gente vai percebendo, não funcionam bem... e aí, retornei às páginas iniciais, aquelas que continham tantos elogios e pensei cá comigo mesmo: “ou os elogios estão errados ou o errado sou eu”.
O livro é cheio de personagens que não têm qualquer relevância na história, parece que o autor se centrou nas mirabolantes reviravoltas de enredo, dando a seus personagens diálogos ruins, alguns ridículos mesmo.
Os conselhos dados por Harry também são de doer:
“— Se os escritores são criaturas frágeis, Marcus, é porque são passíveis de conhecer dois tipos de sofrimentos sentimentais, ou seja, duas vezes mais que os seres humanos normais: as dores do amor e as dores literárias. Escrever um livro é como amar alguém: pode acabar sendo muito doloroso.” (página 115, capítulo 26)
Isto seria uma orientação para um amigo escritor com problemas de bloqueio criativo? Lembramo-nos daquelas frasezinhas-clichês-fofinhas-de-mal-gosto “amar é nunca ter de pedir perdão”.
Neste mesmo capítulo, o 26, um pouco adiante, o autor coloca o seguinte trecho:
“N-O-L-A. Quatro letras que haviam virado seu mundo de cabeça para baixo. Nola, pedacinho de mulher que o fazia virar a cabeça desde que a vira. N-O-L-A. Dois dias depois da praia, encontrara-a em frente à mercearia; haviam descido juntos pela rua principal até a marina.” (página120)
Não se trata de influência de Lolita, de Vladmir Nabokov; soa como uma cópia sem nenhuma criatividade. Se a personagem Lolita, no romance de mesmo nome, é complexa em sua estruturação psíquica, Nola é apresentada como psicótica, mas de construção bastante rasa.
Aliás, de um modo geral as personagens femininas (Nola, Jenny Quinn, Tamara Quinn, Louisa Kellergan, Deborah Cooper) são um tanto esquemáticas, sem profundidade e Nola Kellergan e Jenny Quinn esperam, indefectivelmente, por um casamento que as torne reconhecidas e felizes.
E quando, de acordo com informação dada pelo narrador Marcus Goldman, uma menina de quinze anos revisa o texto do romance do experiente Harry Quebert, o descrédito da obra se instala definitivamente em nossa avaliação.
Douglas Claren, o agente de Marcus, sugere a ele que passe a escrever seu próximo livro sobre suas investigações e descobertas do caso Harry Quebert. Desta forma, estabelece-se, dentro da história, um livro sendo escrito por Marcus-narrador dentro de outro livro, escrito por Jöel. É uma técnica interessante, mas não inovadora.
Joca Reiners Terron, em especial para a Folha de São Paulo, chega a classificar este A verdade sobre o caso Harry Quebert como “leitura de sanitário”. Não chego a tanto. O livro de Jöel Dicker desbancou nada mais, nada menos, que O Inferno, de Dan Brown, em vendagens e na disputa pelo prêmio Goncourt.
Não sei como foi a vendagem da versão brasileira, mas tê-lo encontrado na gôndola de saldos talvez revele a não aceitação pelo público. Se bem que, no mesmo local, encontrei o excelente A Camisa do Marido, livro de contos de Nélida Piñon, já resenhado aqui no blogue.
Mas este é outro caso: livros de contos não vendem bem no Brasil, nem são facilmente publicáveis pelas editoras. Coisas estranhas, no país de poucos leitores, como o nosso. Ademais, li A verdade sobre o caso Harry Quebert na praia e não achei ruim ter dedicado meu tempo a este calhamaço. A ambientação deu o tom certo para a obra: livro para se ler sem qualquer pretensão; passa sem marcar o leitor.

El periódico de Catalunya escreveu, nas páginas iniciais, que este é “um livro que será celebrado e estudado por futuros escritores. É um thriller exemplar.” Está aí uma coisa de que duvido. É tão-somente um livro que prende pela sequência vertiginosa dos turning points (reviravoltas de enredo) e nada mais. Livro para se ler e do qual se esquecer.
Nota atribuída: 6,5

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Feliz 2018, Caros Leitores!

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Olá, pessoal!

Muito bem, 2018 começou e já estamos no dia 19 de janeiro. Perspectivas vão sendo postas nas mesas e nos posicionamos diante delas com ansiedade. O que este ano nos vai trazer? Os corruptos irão todos, mesmo, para a cadeia? A tímida melhora da economia se transformará em algo consistente, que anime as pessoas? Vou ter tempo para ler mais?
É preciso que entendamos uma coisa: as coisas só mudam se contribuirmos de alguma forma, em algum nível, para que isso aconteça. Como vivemos em sociedade, as mudanças também nos afetarão, em um processo de retroalimentação. Creio – a esta altura da vida, com firmeza – é uma cultura favorável à corrupção que faz com que tal fato lamentável se torne tão presente. Em outras palavras polêmicas, temos a corrupção que merecemos. E não é só neste caso; os fatos sociais são produzidos por pessoas.
A situação político-econômica dos EUA, no século XIX e início do XX era uma corrupção só. Conta-se que Al Capone, um traficante, só foi preso porque deu um calote no Imposto de Renda. A lei seca que “vigorava” no território americano não era uma realidade, na prática.
Na verdade, todos os países possuem seus podres históricos. Somos uma civilização oriunda de uma base guerreira e por isso ainda não consolidamos, de fato, certos valores como a cooperação, a ajuda ao próximo. Sei que tais ideias podem ser tachadas de utópicas.
Sou, sim, um otimista de carteirinha. Penso que o pessimismo não constrói nada; a negar tudo, dizer mal de tudo, profetizar o arraso, eu prefiro pensar que, à medida que formos tendo experiências – infelizmente necessárias – com o fracasso, o descontrole, a corrupção, o ódio, iremos descobrindo ferramentas para a construção de uma sociedade melhor, com cada vez mais tolerância, maior respeito às diferenças e menos ódio.
Foi assim com as ditas nações de primeiro mundo, por que a história seria diferente com o nosso Brasil?
Se traçarmos uma linha evolutiva dos valores da humanidade, veremos que houve melhoras. Não no ritmo que eu e vocês gostaríamos; afinal, as mudanças sociais são lentas e difíceis de se implementarem. Somente quando a maioria de mentes e vontades sobem a um novo patamar de comportamento é que temos a consolidação destas mesmas mudanças.
Portanto, desejo a todos os que leem este blogue um ano de 2018 cheio de esperanças e determinações. Acredito, também, que a Arte e, sobretudo, a Literatura têm seu papel a cumprir nesta transformação.
Porque a Arte eleva
Porque a Arte incomoda e propõe alterações
Porque a Arte traz a possibilidade de reflexões e análises.
Como dizem, “livros não mudam o mundo. Livros mudam pessoas. Pessoas é que mudam o mundo”.

Tenhamos todos um ano de 2018 de lutas, de mais acertos do que de erros.