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quarta-feira, 18 de julho de 2018

Resenha nº 122 - Viver em paz para morrer em paz, de Mario Sergio Cortella


Resultado de imagem para livro viver em paz para morrer em pazTítulo original: Viver em paz para morrer em paz
Autor: Mario Sergio Cortella
Editora: Planeta
Copyright: 2017
ISBN: 978-85-422-0976-1
Gênero: Filosofia
Páginas: 174
Bibliografia: Qual é a tua obra?, Vida e carreira: um equilíbrio possível?; Pensar bem nos faz bem; Ética e vergonha na cara; Basta de cidadania obscena; Por que fazemos o que fazemos?, entre outros.

Mario Sergio Cortella é por demais conhecido nos meios de comunicação brasileiros. É filósofo, escritor, com mestrado e doutorado em educação e professor-titular da PUC-SP, com docência e pesquisa na Pós-graduação em Educação. Foi Secretário Municipal de Educação de São Paulo (1991-1992). Foi também Assessor Especial e Chefe de Gabinete do professor Paulo Freire. Exerce atividade como comentarista da Rádio CBN nos programas Academia CBN e Escola da Vida. Tem mais de vinte livros publicados, entre eles, Qual é a tua obra?, Educação, convivência e ética (resenhado neste blog e campeão absolutíssimo de acessos) Vida e carreira: um equilíbrio possível?, com Pedro Mandelli e Pensar bem nos faz bem!
E aqui vai mais uma resenha de um livro do Cortella.  Campeão absoluto de acessos neste blogue, já tendo sido resenhado duas vezes (Por que fazemos o que fazemos e Educação, Escola e Docência – novos tempos, novas atitudes). Gosto muito dos “quatro cavaleiros do apocalipse filosófico”: Leandro Karnal, Mario Sergio Cortella, Luís Pondé e Clovis de Barros Filho. E as obras do Cortella me dão prazer de ler, por alguns motivos bem claros e que vão muito além de me provocar o pensar.
Viver em paz para morrer em paz é um Cortella puro. O texto é agradável de se ler, montado com uma tese, um desenvolvimento e uma síntese ao final. Os temas propostos são aqueles que fazem o nosso dia a dia. Vejamos os 19 títulos nas 174 páginas que compõem o livrinho: 1) O que se aprende com o óbvio; 2) Escrever, para apaziguar; 3) A diferença está na atitude; 5) Experiência e imprevistos; 6) O acolhimento da discordância; 7) O raio da paixão e a construção do amor; 8) Viver em paz; 9) A ecologia, o apego e o erotismo; 10) a graça da vida; 11) A sociedade da exposição; 12) Como me tornei eu mesmo; 13) A criação de diferenciais; 14) Fabricação do passado, anseio de futuro e desespero do consumo; 15) Evolução nem sempre é para melhor; 16) Sexo, o simples e o complexo; 17) Felicidade como vitalidade; 18) Desejo, necessidade, vontade; 19) Razões da existência.
Bem sei que nenhum dos quatro filósofos pops já citados anteriormente goza de unanimidade junto aos que os ouvem. Para muitos, eles não passam de oradores bons de palco e nada mais. O que fazem não seria, de acordo com seus detratores, exatamente filosofia. São apontados como gurus midiáticos, formadores de opinião de um bando de não pensantes.
Não sei você, leitor, mas eu claramente me coloco como alguém que presta bastante atenção à fala destes senhores e sempre acabo caminhando para uma reflexão nova, ou para uma reflexão antiga, mas para a qual me foi fornecido certo ângulo para o qual eu ainda não havia atentado.
Eles não pretendem, em nenhum momento, fazer história da filosofia ou explicar como pensa cada filósofo. Sei também de gente que torce o nariz diante de O Mundo de Sofia, de Jostein Gaarder, por ele, talvez, tornar a história filosófica palatável ao popular. A mesma coisa acontece com os livros de História, escritos por Laurentino Gomes. Podem não descer a grandes profundidades, mas divulgam coisas interessantes ou reflexões oportunas de uma maneira agradável e de acesso ao público.
Não vou pinçar citações capítulo a capítulo, pois isto me levaria fazer longas transcrições. Mas há coisas saborosas e provocadoras – aliás, o subtítulo do livro é já uma provocação: “se você não existisse, que falta faria?
“O que podemos aprender com o óbvio? Podemos aprender que ninguém nasce pronto e vai se desgastando. Nós nascemos crus e vamos nos fazendo. Sim, isso é óbvio, mas como eu aprendi? O que mais aprendi? E o que deixei de aprender? Quais são todas as  coisas que ainda não aprendi? Quando aprenderei? Aprenderei? Sou sempre a minha mais recente edição, revista e ampliada.” (página 19, O que se aprende com o óbvio)
“Assim, o amor é uma sensação de pertencimento recíproco que almeja a plenitude. No fundo, o amor é uma identidade, pois eu me encontro no outro ou na outra. O amor tem turbulências, mas ele não é confrontante, e sim conflitante. O amor, ao contrário da paixão, oferece paz – sendo que paz não é ausência de conflitos, e sim a capacidade de administrar conflitos para que não haja rupturas. Assim, se você consegue guardar o meu amor, se cuida dele, eu fico. Mas, se não cuida nem o guarda, eu parto.” (página 64, O raio da paixão e a construção do amor)
“Na sociedade da exposição e do espetáculo, ver e ser visto é fundamental. O velho ditado ‘diz-me com quem andas e te direi quem és’ ressurge com força. Estar em boa companhia qualifica o acompanhante – até por isso, as pessoas gostam de ir a bares e outros lugares da moda, onde vão artistas e celebridades. Estar cercado de estrelas, de pessoas que brilham, tira o anônimo das sombras, diminui seu pavor da penumbra.” (página 99, A sociedade da exposição)
“Numa cidade como São Paulo, a classe média vai a feirinhas de antiguidades, na praça Benedito Calixto ou no vão do Masp, para comprar a cristaleira da vovó, a poltrona dos anos 1930, a luminária da década de 1940 ou a mesa que nunca é reformada, que comprada para permanecer descascada, algo que nunca se verá nas casas populares. Na casa do burguês, é sinal de riqueza, pois o antigo tem valor.” (página 130, Fabricação do passado, anseio de futuro e desespero do consumo)
“A burguesia cultua o escuro, o tédio. Na Europa, o movimento punk e o movimento dark nascem ligados à ideia de um mundo que não lhes serve, um mundo impregnado de riquezas – mas é a mesma riqueza que os sustenta. O movimento hippie das décadas de 1960 e 1970, do qual fiz parte, carregava a ideia da simplicidade, e a simplicidade era o brilho. Era o Flower Power, o poder da flor, da cor; não o da olheira, do rímel, da Amy Winehouse.” (página 132, Fabricação do passado, anseio de futuro e desespero do consumo)
“Insisto na ideia: Adão e Eva desobedecem  Deus para poderem ser mortais. Para poderem sentir seus corpos. Para sentirem dor e depois alívio. Cansaço e depois descanso. O paraíso devia ser tedioso. A serpente cumpre uma grande função, ainda que de natureza simbólica, ela nos permite a felicidade.” (página 160, Felicidade como vitalidade)
“Henry Kissinger, ex-secretário de Estado dos Estados Unidos da América, disse que ‘sexo é para principiantes; os experientes gostam é de poder’. A questão central do poder é ser visto para não ser esquecido. Kissinger estava certo. O que mais levaria certos políticos brasileiros que já tiveram tudo a continuar na vida pública até a degradação? O que leva alguém a se ver em situações constrangedoras? Para que continuar? Porque eles precisam continuar visíveis.” (página119, A criação das diferenciais)
Como sempre, os textos deste Viver em paz para morrer em paz são fluidos, muito bem escritos e seu autor usa com frequência a etimologia das palavras para daí extrair os conceitos com os quais trabalha:
“O curioso é que a palavra ‘evolução’ se vale de um radical usado no grego e no latim, o radical vol, formador de palavras como ‘envolver’ e ‘vulva’, que mais tarde será utilizado como ‘rol’, de ‘rolar’, que dá ideia de desenvolvimento.” (página 140, Evolução nem sempre é para melhor)
Não classifico o gênero dos textos deste livro como de auto-ajuda; estes são os que dão um conselho bobo a cada parágrafo, como “sorria para o mundo e o mundo sorrirá para você”... hum hum, já tentei e não deu certo...
Se você, leitor, gosta deste tipo de leitura, aconselho a leitura dele. A nota que lhe dou (ao livro, é claro) é um redondo 9,0. Abraços!

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