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terça-feira, 31 de julho de 2012

Resenha nº 16 - O Poder dos Quietos, de Susan Cain

Acabei de ler O Poder dos Quietos, de Susan Cain. É classificado, pela livraria onde o comprei, no gênero de auto-ajuda. Não sei bem por quê. Talvez pelo seu último capítulo, no qual Susan arrola uma série de conselhos para os introspectivos, inseridos numa cultura que privilegia os extrovertidos. Mas, no resto, parece-se com um estudo, solidamente baseado em obras relevantes e trocas de ideias com autores de peso.

Cain separa didaticamente os dois extremos da personalidade humana: de um lado, os extrovertidos, de outro, os introvertidos, embora reconheça que não há temperamentos puros. Conceitua os extrovertidos como aqueles que buscam os holofotes da mídia, são faladores, comunicativos em tempo integral, festeiros; têm pavor de ficarem sozinhos. Já os introvertidos são os outros, que não promovem a autoexposição, preferem o contato com poucos amigos, dão-se bem em trabalhar sozinhos e, se vão a uma festa barulhenta e cheia de risadas, costumam passar despercebidos, indo embora tão logo seja possível.

Esses dois extremos do temperamento humano sempre intrigaram psicólogos. Estudiosos, desde a Grécia antiga, tentaram desvendar esse mistério dos temperamentos humanos; o tipo introvertido sempre foi confundido com o tímido, embora recentemente se faça diferença entre eles. Resumindo, o tímido tem pavor de falar em público, por exemplo, enquanto o introvertido, se for necessário, fala em público, mas prefere não fazê-lo.

O Poder dos Quietos defende a ideia de que os introvertidos são normais, e que o  mundo tanto tem lugar para a extroversão quanto para a introversão. E Cain narra um fato esclarecedor: Rosa Parks era uma negra diligente e honesta. Trabalhou vários anos nos bastidores da Associação Nacional para o Avanço de Pessoas de Cor e chegou a receber treinamento  em resistência não violenta. Certo dia, ela foi colocada numa situação constrangedora, pois ao entrar num ônibus, o motorista James Blake a maltratou por ser negra e entrar pela porta da frente. “Saia do meu ônibus", berrou ele. Ela obedeceu-lhe, não sem antes deixar cair propositalmente sua bolsa e, para apanhá-la, sentou-se no lugar para os brancos. Os desdobramentos desse acontecido levaram a “quieta” Rosa Parks a participar de um amplo movimento em favor dos negros, tendo ela sido palestrante em um ciclo promovido por ninguém menos que Martin Luther King Jr.

Susan Cain nos esclarece a respeito de pesquisas feitas com crianças muito reativas e pouco reativas a estímulos externos. Enquanto os bebês pouco reativos se constituem em adultos extrovertidos, os que são muito reativos dão adultos introvertidos. Essa correlação caminha na direção da validação científica: nascemos com programação de temperamento.

Dessa forma, Albert Einstein, Barack Obama, Chopin, Steven Spielberg, J. K. Rowling, Bill Gates e Mahatma Ghandi têm algo em comum: são introvertidos de carteirinha. O subtítulo do livro é indicador: “Como os tímidos e introvertidos podem mudar um mundo que não para de falar”. A própria autora de O Poder dos Quietos se declara introspectiva.

Há grupos de pessoas que necessitam muito mais de um líder introspectivo do que de um extrospectivo. Se são trabalhadores de alguma atividade intelectual, criativa, o ideal é um líder quieto, a deixar a turma fazer seu trabalho e depois, discutir com eles em pé de igualdade. Um líder extrospectivo é necessário naqueles grupos em que há real necessidade de a liderança levá-los a dar o melhor de si.

Ainda, contra a ideia de os introvertidos serem antissociais, Cain nos esclarece que eles são também socialmente participantes, mas do jeito deles, isto é, socializam-se bem com pequenos grupos de pessoas por vez.

Escutei de uma participante de uma banca examinadora de dissertação de mestrado, que o candidato era um representante da força do caos; ela assegurava que existem os que tiram sua energia da ordem. Aqueles que recarregam suas baterias da “força do caos” são os extrovertidos. Os outros, alimentados pela força da ordem, são os introvertidos.

Gostei muito do livro por dois motivos: primeiro, por ser uma leitura esclarecedora de muitas questões psicossociais; segundo, por eu ser também um introvertido. O Poder dos Quietos iluminou vários ângulos obscuros do meu próprio temperamento e me explicou como eu, um “quieto” por natureza, consegue ser professor e falar em público.

Na resenha do Bartleby e Companhia, de Enrique Vila-Matas, afirmei ter aquele livro e esse vários pontos em comum. E como têm! Os bartlebys são, invariavelmente, introvertidos…

Susan Cain. O Poder dos Quietos. Editora Agir, Rio de Janeiro, RJ, 2012. 334 páginas. R$ 29,90

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